O assédio sexual no mundo do trabalho, trazido à tona após a repercussão do caso do ator global José Mayer, que teria assediado a figurinista Susllen Tonani, colocou em discussão a situação das mulheres perante o caos de ser assediada, ao mesmo tempo com o risco de ser demitida do emprego, além da banalização das situações constrangedoras pelos homens e até por algumas mulheres. No caso global, a emissora divulgou o afastamento temporário de Mayer, que emitiu uma carta se desculpando pela situação. Algumas atrizes saíram em defesa da figurinista com a campanha ‘Mexeu com uma mexeu com todas’. Também teve atores que saíram em defesa de Mayer.
Para o advogado Marcus Vinicius Ramos Gonçalves, presidente do ILADEM (Instituto Latino-Americano de Defesa e Desenvolvimento Empresarial), condutas como elogios ligados a beleza e forma física, brincadeiras de duplo sentido, mãos que pegam ou encostam, apelidos para dar/trazer intimidade, comentários com outros colegas sobre os atributos físicos (sempre audíveis por aquela que é a detentora de tais atributos), entre outros, que estão relacionados ao poder que, de alguma maneira, exerce o assediador, por conta de seu cargo ou função, autenticamente vincula manutenção do emprego ou ascensão na carreira à uma ‘retribuição’ de cunho sexual.
“Ele não colocou a mão em mim e não me obrigou a sair com ele, mas só eu sei a gastura que eu sentia a cada indireta, elogio, proximidade sem necessidade, enfim. Eu tentei até o fim manter o jogo de cintura e fingir que não estava acontecendo nada, mas aquilo me desestimulava a sair de casa para ir ao meu emprego. Aliás, ele era o chefe, se sentisse rejeitado, como já aconteceu, se afastava e indiretamente tomava decisões que me prejudicavam. Tive que aguentar pelo meu emprego, para não ser mais prejudicada, mas posso garantir que não foi fácil”, contou a relações públicas de 29 anos que não quis se identificar.
Ela não é a única mulher que sofreu com esse tipo de situação. Uma pesquisa realizada no ano passado pela empresa Vagas.com, mostrou que o assédio moral e sexual no ambiente de trabalho é mais comum do que se pensa. Do grupo que declarou ter sofrido por comportamentos abusivos como cantadas, propostas indecorosas ou olhares abusivos, 79,9% são mulheres. Os ‘atores’ do constrangimento, em sua maioria, 84%, são chefes diretos das vítimas ou alguém que tenha um cargo mais alto dentro da hierarquia das empresas. O MTE (Ministério do Trabalho e Emprego) também confirmou que as mulheres são a maioria a sofrer abuso no ambiente de trabalho.
A pesquisa mostra ainda que, entre os profissionais que passaram por assédio, 39,6% disseram que o episódio impossibilitou ou causou dificuldades no desenvolvimento profissional.
Para o advogado, o problema do assédio sofrido pelas mulheres, é uma questão cultural, reafirmado nos meios de comunicação e nas propagandas. Ele afirma que a solução passa pela abordagem pública do assunto. “Penso que, enquanto cidadãos, podemos trazer o debate para perto. Podemos cuidar do nosso jardim. Podemos fazer esse debate no meio corporativo, abordando-o de variadas formas. Reparem que, em nosso dia-a-dia, não nos chocamos como a propaganda de cerveja que só mostra peito e bunda de mulher (…). No ambiente de trabalho, em que atuam tais gestores, comportamentos até mais danosos são diariamente repetidos e nem nos damos conta. Quem sofre são elas…E sofrem. Recebemos, depois de ter encampado esta cruzada, um grande número de relatos de mulheres que, por anos, são sexualmente assediadas em seu ambiente de trabalho. Aliás, jornalistas, cuja facilidade de trazer o tema a público foram alvo de ataques, como no caso que envolve um polêmico deputado. É desumano!”, afirmou o especialista.
Legislação
De acordo com o MTE, o assédio sexual é uma forma de abuso de poder no trabalho e consiste em constrangimentos constantes por meio de cantadas e insinuações.
Segundo a professora Adriana Calvo, da PUC-SP (Pontifícia Universidade Católica de São Paulo), há dois tipos de assédio sexual, que pode ser de intimidação ou chantagem. Nesse último caso, a lei 10.224 de 2001 criminaliza o assédio sexual em situações em que o autor da prática se vale de sua posição hierárquica para constranger alguém de modo a obter favorecimentos sexuais. Entre as sanções, a legislação trabalhista prevê demissão por justa causa. Além disso, o transgressor pode pegar de um a dois anos de prisão.