Somos TODOS Trans!

No Brasil, os índices de violência mostram que a discriminação e o preconceito estão presentes no cotidiano da população LGBTI+. Segundo dados, só em 2020 foram 237 mortes contra pessoas LGBTI+ – números, supõe-se, abaixo da realidade, por se tratar de crimes com grande índice de subnotificação, tratados como delitos comuns pela polícia, e não como crimes de ódio. De acordo com relatório de 2020 da Associação Nacional de Travestis e Transexuais (ANTRA), chegaram ao número de 175 assassinatos, todos contra pessoas que expressavam o gênero feminino em contraposição ao gênero designado no nascimento, que foram considerados nesta pesquisa.

No estado de São Paulo, existe a lei 10.948/01 que, já há 20 anos, considera punível, em âmbito administrativo, toda manifestação atentatória ou discriminatória praticada contra cidadão homossexual, bissexual ou transgênero. Nesse sentido, o legislador paulista entendeu que, a pessoa física ou jurídica, pública ou privada, que usar violência física e moral, constranger ou intimidar pessoas, não permitir a entrada ou permanência em qualquer ambiente aberto ao público, recusar ou impedir atendimento em ambientes comerciais, rejeitar, sobretaxar ou impedir hospedagens e/ou aquisições de bens móveis e imóveis, não admitir ou demitir, direta ou indiretamente, em função da orientação sexual do emprego, proibir a livre expressão e manifestação de afetividade, sendo estas permitidas aos demais cidadãos, deve ser apenada em razão da conduta discriminatória. Para quem não sabe, as punições podem chegar perto de R$ 800.000,00 e, no caso das pessoas jurídicas, pode-se ter a licença estadual para funcionamento cassada.

Notemos que a legislação paulista alcança relações bastante abrangentes e, nesse sentido, queremos focar o debate naquelas do mundo corporativo, do dia a dia das empresas.

Estreitando nossa reflexão, numa pesquisa feita no TRT02, a Justiça do Trabalho de São Paulo, de 2014 para cá, condenou centenas de empresas por conta de reclamações trabalhistas propostas por empregados que foram discriminados e humilhados em seus respectivos ambientes de trabalho em razão da sua opção/orientação sexual. Números semelhantes em outros tribunais trabalhistas espalhados pelo país, demonstram que esta é apenas mais uma outra forma de violência contra os LGBTI+.

A prática se desdobra de várias maneiras: empregadores que não chamam seus colaboradores pelo nome social, chefes que dispensam tratamento hostil aos empregados LGBTI+, colegas que ridicularizam vestes e gestos. Nas situações de maior humilhação, até o uso obrigatório de banheiros ou vestiários diferentes da identidade de gênero.

O que está em xeque é a cultura que estabelecemos em nosso ambiente de trabalho, bem como, a responsabilidade advinda dela. A ideia de humilhar ou permitir que sejam humilhadas pessoas, em qualquer ambiente, por conta de suas crenças, sexualidade, nacionalidade, cor de pele etc., em pleno século 21, denota que permanecemos ainda selvagens.

A perspectiva do respeito, que deve permear as relações humanas, deve ser levada à cabo não só em relação aqueles que se vestem, agem ou têm as mesmas crenças que nós. Respeitar apenas o espelho é não respeitar ninguém.

Os números mostram que a violência e a selvageria contra essa população se dão de várias formas, nos mais variados contextos. Todavia, cremos que o mundo corporativo, em razão da sua força econômica, é capaz de responder e conduzir uma mudança de mentalidade. Quando pensamos no trabalho e no resultado que se produz dele, será que importa aos acionistas ou cotistas das empresas se o lucro amealhado vem do esforço crentes, macumbeiros, judeus, palestinos, pretos, brancos, transgêneros ou heteros? Cremos que não. Tanto faz. Nessas horas, na colheita dos resultados positivos, podemos ser todos trans…

Por: Dr. Marcus Vinicius Ramos Gonçalves.
Sócio na BRG Advogados

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