Aumento do Pis e Cofins sobre importações fere tratados internacionais

Veículo: Folha de São Paulo

 

No último dia 19 de junho foi sancionada a lei nº 13.137 (conversão da MP 668), que elevou as alíquotas das contribuições ao Pis e a Cofins quando ocorrida importação de bens e serviços. Essa lei é parte final no famigerado “Ajuste Fiscal” promovido pelo governo federal e base aliada, que visa aumentar a arrecadação de tributos a fim de rebater a crise econômica que assola o país.

Com o pretexto de igualar a indústria e os produtos nacionais aos importados, que teriam eventual efeito predatório, foram elevadas as alíquotas de 1,65% (Pis-importação) e 7,6% (Cofins-importação) para 2,1% e 9,65% respectivamente, entretanto, tal medida não atende o fim oficialmente pretendido e ainda desrespeita princípios e normas externas e tratados internacionais sobre o tema.

Na verdade, esse aumento, camufladamente, tem o intuito de cobrir o “rombo” que os cofres do governo federal sofrem desde a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que determinou a exclusão do ICMS da base de cálculo de Pis e Cofins –importação (recurso extraordinário 559.937), que poderia chegar, segundo o próprio ente federativo, a quase R$ 34 bilhões.

E mais, a elevação de alíquotas representa verdadeira violação a tratados internacionais dos quais o Brasil é signatário e que vigoram no sistema normativo brasileiro com real força de lei.

Note-se que os tratados em matéria tributária são recepcionados pelo sistema jurídico brasileiro como sendo superiores à legislação tributária, por força do art. 98 do CTN (Código Tributário Nacional) que dispõe que “os tratados e as convenções internacionais revogam ou modificam a legislação tributária interna, e serão observados pela que lhes sobrevenha”.

Na prática, os tratados e convenções, quando devidamente inseridos no ordenamento pátrio, revogam as lei ordinárias a eles anteriores e devem ser respeitados (leia-se: não podem contrariá-las) pelas que venham a ser editadas, não se aplicando às leis complementares, visto à especialidade e reserva de matéria das mesmas, como tem decidido o STJ e STF.

Isso se dá por conta do grau de complexidade e de interesse internacional na elaboração e aplicação dos tratados e convenções, que envolve vários Estados soberanos, organismos internacionais, além de que, o Brasil não pode “unilateralmente” alterar a disposição constante do tratado ou convenção por advento de lei interna.

Considerando a importância desses tratados, observa-se que a lei n° 13.137/2015 desrespeita, flagrantemente o disposto no GATT (Acordo Geral sobre Tarifas Aduaneiras e Comércio), firmado entre vários Estados e a Organização Mundial do Comércio, e o próprio Mercosul.

De fato, a mencionada lei trata desigualmente os produtos importados dos nacionais, o que é expressamente vedado pelos instrumentos internacionais em comento. Mesmo sob o pretexto de se aplicar a isonomia, o governo federal a desrespeita e o faz descumprindo os tratados e convenções.

O texto dos tratados dispõe que “não haverá distinção entre um produto que ingressa no mercado de país signatário quando vindo de outro país signatário”, mormente no que toca taxas e tributos, que “devem ser aplicados na mesma proporção dos aplicados aos produtos internos”.

Considerando que o aumento de alíquota só é aplicado aos produtos que vem do estrangeiro (total de 11,75%), e que os nacionais continuam com as alíquotas anteriores (total de 9,25%), vislumbra-se o patente desrespeito aos tratados e convenções mencionados, além de outros, dependendo do país em que se origina a importação.

Assim, trata a legislação tributária brasileira desigualmente produtos que os tratados e convenções internacionais, dos quais o Brasil é signatário e que foram recepcionados pelo ordenamento jurídico, determinam que sejam tratados de maneira igual.

O governo federal, ao tentar cobrir prejuízo causado pela própria atividade legislativa e tributária considerada inconstitucional, acaba por ferir o princípio da Isonomia, quando considerados os tratados e convenções internacionais dos quais é signatário.

Tal curso de ação do governo federal pode culminar, além do prejuízo material que experimentarão os contribuintes diretos (importadores) e indiretos (consumidores), no aumento de preços e queda nas vendas das empresas que utilizem ou comercializem os produtos importados, de maneira que, em casos extremos, pode causar até a demissão de funcionários, devido a queda no faturamento das jurídicas.

É imperativo que o contribuinte se insurja à cobrança que mostra-se incompatível com o sistema internacional de tributação e os próprios princípios e garantias encartadas na Constituição Federal, podendo chegar, em última instância, nos tribunais internacionais para ver seu Direito preservado.

 MARCELO DIAS FREITAS OLIVEIRA, advogado, é consultor tributário e associado do escritório Bertolucci & Ramos Gonçalves Advogados

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