Veículo: DCI
– Depois da confusão entre Senado (Legislativo) e STF (Judiciário), onde ficou patente a fragilidade das nossas “sólidas instituições”, o “vitorioso” deu sinais do poder da sua vitória. Com rapidez, o Senado realizou três sessões legislativas em meio dia, e a “PEC do Teto” vai à votação nesta terça (13). Não importa o teor da discussão, o que importa é aprovar a PEC.
Mas do que trata a PEC do Teto? Altera o texto do nosso “livrinho”, a combalida Constituição de 1988, mais exatamente no ato das disposições constitucionais transitórias, estabelecendo que o Executivo, Legislativo e Judiciário não poderão gastar no ano seguinte mais do que gastaram no anterior, corrigido pelo IPC-A. Caso não respeitem esse limite, ficam impedidos de contratar, realizar concursos, dar aumento de pessoal, conceder incentivos tributários, etc.
Vamos limitar o teto do gasto. Bom sinal. Na sua casa, quando as coisas não vão bem, quando sua renda não anda lá estas coisas, o que você faz? Limita, pura e simplesmente, o teto de gastos? Ou será que você adapta o seu gasto à sua receita e rediscute o seu porquê?
Que me perdoem os economistas e governistas, todavia creio que, de novo, estamos vendendo o sofá…
Evidente que é importante limitar o gasto. No entanto, não seria também muito apropriado discutirmos a qualidade do gasto? Como podemos pensar no teto do gasto sem pensar no porquê de gastarmos?
Tenho exemplos aos borbotões. Cada deputado tem, só para exemplificar, R$ 78 mil mensais para contratação de pessoal. Multiplicando por 513, o Senado custa aos cofres públicos, por senador, mais de R$ 2 milhões anuais. Podemos falar de carros oficiais (do Executivo, Legislativo e Judiciário), de verba moradia, etc. Recente estudo mostra que o ingressante na carreira pública federal tem salários até 200% maiores que na iniciativa privada. Estes são alguns exemplos que ilustram o que devemos discutir de verdade: a qualidade do gasto. Não só o seu teto.
Demais disso, deve-se abordar a receita. Falar de gasto sem falar de receita fica estranho, para dizer o mínimo. Somos um país de carga tributária brutal, regressiva e indireta. Quem mais paga tributo no Brasil é o pobre, porque o coitado gasta toda sua renda no consumo de bens e serviços escorchantemente tributados.
Temos muitos tributos, alta carga tributária e, contudo, uma série de isenções e imunidades tributárias que desoneram grupos que possuem forte articulação política.
A pergunta que deve ser feita é a seguinte: limitar o teto é uma solução eficaz? Ou estamos fazendo tudo “para inglês ver”?
Devemos nos debruçar sobre a qualidade do gasto e da receita. Gasto público deve ser revisto, todo ano, pensando naquele que é o destinatário da coisa pública, o povo.
Ficaria feliz em saber que, ao criar um teto, colocaríamos as coisas em ordem. A crítica feita não é no sentido de contestar a necessidade de se ter um freio rigoroso de gastos, contudo, muito ao contrário, é para alertar que a conversa deve ser aprofundada, não pode ficar na superfície do problema. O “como” tem a mesma importância do “quanto”. O critério qualitativo da despesa deve ficar no nosso radar, ser meticulosamente verificado. Quem sabe, discutindo também a razão do gasto, o Estado deixe de ser um fardo na vida dos brasileiros.
A discussão continua rasa, sem atingir o que tem importância.
Marcus Vinicius Ramos Gonçalves
mvgoncalves@brgadvogados.com.br
Presidente daComissão de Comunicação OAB/SP